Páginas

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Misturando tudo

Estou passando por um momento novo em minha vida. Quando se entra em uma universidade, percebemos que o ritmo agora é outro. Não só a liberdade é maior, como as responsabilidades também. Estou me graduando em filosofia. Com isso, a situação muda ainda mais. As discussões tornam-se mais frequentes. O teor das discussões se torna diferente. E a cabeça voa ainda mais.

confusoUm ensinamento que tive, e aqui repasso, com algumas mudanças, é o que se refere ao título deste post. Sim, misturamos as coisas, e disso sabemos. Acho que todos que leem esse blog já se viram em situações onde perceberam que “trocaram uma coisa pela outra”, se confundiram, misturaram as coisas. Perceber isso parece algo natural e obviamente simples, porém misturamos também os discursos sobre as coisas, e isso é bem prejudicial (ou mesmo incoerente).

Uma pessoa diz que não acredita em Deus, por exemplo, e usa o argumento de que não pode ser provado cientificamente, que não é lógico acreditar quando a ciência não pode atestar. Isso é um exemplo de mistura de discursos. A forma com que a religião constrói sua concepção de realidade não é a mesma que a ciência constrói, logo não podemos misturar os discursos e tentar atestar uma verdade de um pela forma de atestado feita pelo outro discurso.

Seria como pensássemos que pudéssemos analisar um quadro surrealista da mesma forma que analisamos sintaticamente uma frase. Ou se pensássemos ser possível analisar a utilidade da água, de forma científica, enquanto estamos nos afogando no vasto mar. Isso é mistura de discursos, isso é confusão. Devemos entender que podemos analisar a verdade de algo apenas pelo contexto em que entendemos esse algo.

Um cientista vê a água como H2O, um padre vê a mesma como objeto de batismo espiritual, um homem sedento vê a mesma como salvação de sua vida. Em cada relação, a água é uma coisa diferente, algo distinto. O cientista não pode dizer que o padre vê a água incorretamente, pois o padre não está em uma relação cientifica com o objeto.

cuspe1Não precisamos aceitar todos os discursos. Por exemplo, podemos escolher se vamos seguir ou não uma crença religiosa, se vamos aceitar o que a ciência diz sobre as coisas, podemos questionar se é correta ou não a utilidade de algo para tal pessoa, mas devemos primeiro entender o contexto em que a relação é dada. Não há uma única verdade, mas há verdades, no plural, e as verdades dependem da relação estabelecida. Um cientista, por exemplo, pode analisar cientificamente uma teoria cientifica, e entender se é correta ou não, segundo a ciência. Imaginem como seria um cientista contestando uma teoria porque a bíblia não a valida.

Você pode perguntar: mas então, porque o papa, por exemplo, pode dar a última palavra em assuntos científicos, como pesquisas, se ele é autoridade religiosa, uma outra relação de verdade? Eu só posso responder que infelizmente, não vivemos em um mundo que entende a verdade de forma relativa... Por isso há padres autorizando pesquisas científicas, cientistas tentando provar a veracidade bíblica, críticos analisando o sentido de obras de arte (que não trabalham com o sentido, por exemplo, ou trabalham, em uma logica diferente, paradoxal). Nem tudo é perfeito, infelizmente.

Nenhum comentário:

Postar um comentário